Por Mohammad Padilha
Aos amigos que me leem, devo dizer sem pudores que, em razão dos meus escritos, já fui chamado de tudo; de sacana a escroto; frio; sarcástico; esnobe; gozador, pedante, intelectual de meia tigela, boçal, brutal, louco e tal. Mas somente um grande amigo extremamente erudito, claro, ele lá na frente pilotando sua Ferrari de erudição e eu cá atrás com meu Chevette amarelo de pneus carecas e motor queimando óleo, às vésperas de bater bielas. Um lento beócio numa corrida desigual, mas corrida com meu crítico amigo. Amigo mesmo!
Somente esse amigo, erudito ate nas adjetivações com que me imprecava puto da vida e invejoso por minhas “tiradas”. Sentir-me invejado me trazia um estranho ufanismo de “elogiado”. A sua inveja ferina era indisfarçavelmente impregnada pela frustração; ele invejava meu idiomatismo coloquial destampado, minha franqueza e despudor literários; agradava-me o ego, sua “escrotidão” quando me chamava de sátiro – Aqueles pequeninos diabinhos alados e com chifrinhos, personagens que figuram no “Piquenique de Vênus com Hercules”, retratado em óleo sobre tela de quatro metros pelo pintor renascentista, Botticelli, exposta no Louvre. – Minha verve era, por assim dizer, intelectualmente admirada.
Nessa tela, aparecem quatro pequeninos sátiros que, a pedido de Vênus, fazem bazófias, fustigando Hercules com pequeninas lanças e tocam trompas ruidosas aos seus ouvidos para acordá-lo de sono indevido e profundo, enquanto Vênus é deixada à espera, ardendo de amor e luxúria, decepcionada pelo adormecimento em hora tão inapropriada do seu amado Hercules.
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