Matéria do Estadão
O juiz federal Sergio Moro afirmou em evento na noite desta sexta-feira, 8, em Chicago, que ele não define sentenças judiciais pensando em impactos políticos que elas possam ter e que ao final da Operação Lava Jato, só pensa em tirar longas férias. O juiz também se disse incomodado com a repentina fama e afirmou que foro privilegiado não é sinônimo de impunidade.
“O juiz profere sua decisão com base nas leis, nas provas, nos fatos. Minha preocupação é definir com base no processo. Não posso pensar no impacto político daquilo”, disse durante palestra de cerca de 90 minutos na Universidade de Chicago, que reuniu 300 estudantes nos Estados Unidos e foi organizada pela Associação de Estudantes Brasileiros (Brasa, na sigla em inglês).
“É importante não confundir Justiça com política”, afirmou o juiz. Se a decisão tem um impacto político, Moro disse que é porque são julgados crimes praticados por políticos. “Até vejo críticas ao meu trabalho, mas não sou um juiz investigador, não dirijo as investigações.” Moro reconheceu em sua palestra que erra em suas decisões. “Vamos ser claros, eu também não acerto todas, mas sempre decido como um juiz deve definir, com a pretensão de estar decidindo conforme as leis.”
Fama.
Questionando por um dos participantes sobre a fama repentina, que fez a revista norte-americana Fortune o colocar como o 13º líder mais influente do mundo, Moro disse que se sente incomodado. “Acho que existe foco equivocado na minha pessoa, que não acho muito positivo. Há uma certa personificação”, afirmou, destacando que é um juiz de primeira instância e que as investigações da Lava Jato envolvem a Polícia Federal e o Ministério Público.
Na palestra, o médico Drauzio Varella questionou Moro por que a Lava Jato tem condenado mais empresários que políticos. O juiz disse que já condenou três ex-parlamentares, além de funcionários da Petrobrás, e que outros políticos têm o chamado foro privilegiado. “Foro privilegiado não é sinônimo de impunidade”, afirmou o juiz.
Moro afirmou que a grande questão que se coloca neste momento é se a Operação Lava Jato vai levar a ganhos institucionais duradouros ou não. “Isso não depende dos juízes, não depende dos políticos, depende dos eleitores.”
Na parte de perguntas, um dos estudantes questionou Moro sobre como ele via as críticas à divulgação dos áudios de gravações telefônicas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que também aparece a presidente Dilma Rousseff. O juiz disse que já prestou as explicações ao Supremo Tribunal Federal e pelo fato do caso estar em andamento, não poderia fazer maiores comentários.
‘Corrupção sistêmica’. Moro afirmou também que o quadro de corrupção sistêmica no Brasil “incomoda” e “assusta”, além de ter “custos enormes” para o País e de manchar a imagem da política e de políticos.
Moro foi bastante aplaudido quando começou sua apresentação. Logo no início, contou que a Operação Lava Jato começou pequena, intensificou-se a partir de 2013, mas ganhou impulso “muito significativo” em 2014. “Havia um fiapo de prova e, de repente, o caso começou a crescer e, num efeito dominó, de bola de neve, se transformou em uma gigante investigação que nós hoje até nos assustamos com o tamanho.”
“O quadro de corrupção sistêmica erode nossa confiança na lei, na democracia. O cidadão comum passa a desconfiar dos políticos, dos eleitos”, disse Moro. “O cidadão de bem não se sente à vontade para ir para política e os piores são motivados a ir para a política, fica uma seleção natural às avessas.” Moro ressaltou que a corrupção existe em qualquer lugar, seja na Ásia, na Europa e nos Estados Unidos, mas no Brasil tomou ares sistêmicos, uma prática comum.
Sem citar nomes dos envolvidos na Lava Jato, Moro contou alguns exemplos de casos e citou o de um ex-deputado que, enquanto era julgado pelas investigações do mensalão, recebia propina no esquema da Petrobras. O juiz disse ainda que as investigações mostraram que esse ex-deputado também se apropriava de metade dos salários de uma servidora pública e de outra servidora fantasma. “Essas são coisas perturbadoras.”
“Temos que enfrentar esses problemas”, disse Moro, falando da necessidade do combate à corrupção, destacando que não se pode jogar as coisas para debaixo do tapete. Disse que, se o problema não for combatido agora, terá que ser combatido mais à frente. “Não há alternativa a não ser seguir em frente”, afirmou.
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