Tese Eleitoral de advogado ilheense é aprovada com distinção na USP


Na foto ao lado, da esquerda para a direita: Michel Temer, Cláudio Lembo, Manoel Carlos, Ricardo Lewandoski, Monica Herman Caggiano e Heleno Torres

O Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal — a pretexto de regulamentar eleições — estão, em muitos casos, substituindo, indevidamente, o Congresso Nacional. Esta foi a tese de doutorado defendida esta semana pelo advogado ilheense Manoel Carlos de Almeida Neto no Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), sob o título “O Poder Normativo da Justiça Eleitoral”.

Professor de Direito Constitucional e Eleitoral, Manoel Carlos é mestre em Direito Público pela UFBA e assessor da vice-presidência do STF. No TSE, foi assessor-chefe e secretário-geral da presidência entre 2009 e 2012, experiência usada na produção da tese que aplica teoria jurídica à prática eleitoral.

A banca examinadora foi composta por notáveis como o vice-presidente da República, Michel Temer; o vice-presidente do STF, Ricardo Lewandowski (orientador); o ex-governador Cláudio Lembo; a presidente da Comissão de Pós-Graduação da USP, Monica Herman Caggiano; e pelo coordenador do Curso de Direito, Heleno Torres. Após uma sabatina de quase 4 horas, a tese foi aprovada com distinção, louvor e recomendada para publicação.

O pano de fundo é a história do direito eleitoral brasileiro. O estudo disseca a atividade regulamentar da Justiça Eleitoral, traça origem, define o conceito, a tipologia, fundamentos, pressupostos de existência, requisitos de validade e seus paralelos no Direito Comparado.

Como exemplo de ingerência, Manoel Carlos desenvolveu a teoria das nulidades eleitorais para criticar o tratamento dos votos anulados por decisão judicial após a eleição majoritária em dois turnos. A Justiça Eleitoral os exclui da base de cálculo do quociente eleitoral, o que não poderia ser feito, já que o voto é relativamente e não absolutamente nulo. Ou seja: pratica-se um ativismo judicial ilegítimo ao dar posse ao segundo colocado não eleito, isto é, sem a maioria absoluta dos votos como impõe a Constituição.

Segundo a tese, “a maioria constitucionalmente exigida no segundo turno também é absoluta, pois as expressões ‘maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos’ (art. 77, § 2º) e ‘maioria de votos válidos’ (art. 77, § 3º) são equivalentes. Assim, com base em tais premissas, conclui-se que, ao considerar, como absolutamente nulos, os votos anulados após a eleição majoritária realizada em dois turnos, o Tribunal Superior Eleitoral afronta os princípios constitucionais da soberania popular (art. 1º, parágrafo único, combinado com o art. 14, caput) e da maioria (art. 77, §§ 2º e 3º), pois a maioria encontrada na fórmula engendrada não corresponde à verdadeira maioria absoluta que se impõe no pleito majoritário”.

Assim, “na hipótese de dupla vacância nos cargos de Chefe do Executivo, independentemente da identificação de sua causa, não pode a Justiça Eleitoral afastar a aplicação do parâmetro Constitucional da eleição — direta ou indireta — consagrado no art. 81 da Constituição Republicana ou conforme estabelecer a respectiva Constituição Estadual ou Lei Orgânica Municipal, sob pena de transgressão ao princípio constitucional da soberania popular”.

Em outro bloco de resoluções eleitorais e decisões judiciárias que avançam sobre matéria reservada ao Legislativo estão as decisões sobre a verticalização das coligações partidárias, a infidelidade partidária como causa de perda do mandato, ambas originárias de consultas eleitorais que não deveriam ter efeito nenhum vinculante e, segundo a tese, ganhou contornos de Emenda Constitucional.

O trabalho sustenta ainda, a inconstitucionalidade de sucessivas resoluções eleitorais que modificaram a redação do art. 16-A da Lei das Eleições, na esteira da jurisprudência do TSE, para considerar nulos, sob todos os efeitos, inclusive para a legenda, o cômputo dos votos atribuídos a candidatos que tiveram os seus registros indeferidos após o dia da eleição.

Para Manoel Carlos, “ignorou-se, solenemente, o § 4o do art. 175 do Código Eleitoral que assegura a validade e o cômputo dos votos para o partido ou coligação, quando a decisão de inelegibilidade ou de cancelamento de registro foi proferida após a realização da eleição”. Portanto, “o parágrafo único do art. 16-A da Lei das Eleições não colide com o § 4o do art. 175 do Código Eleitoral. Os dispositivos coexistem e são complementares, pois, o primeiro trata de candidatos com registro indeferido e sub judice no dia da eleição, já o segundo diz respeito ao candidato que tiver o seu indeferimento após o pleito”.

Considerada corajosa pela banca examinadora, a tese também adverte que o poder regulamentar e normativo da Justiça Eleitoral deve ser exercido dentro de certos limites formais e materiais, uma vez que os regulamentos eleitorais só podem ser expedidos segundo a lei (secundum legem) ou para suprimir alguma lacuna normativa (praeter legem). Fora dessas balizas, quando a Justiça Eleitoral inova em matéria legislativa ou contraria dispositivo legal (contra legem), por meio de resolução, ela desborda da competência regulamentar, estando, por conseguinte, sujeita ao controle de legalidade ou constitucionalidade do ato.

Ao final da sabatina pública que durou quase 4 horas, a presidente da Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP Monica Herman Caggiano recomendou que a tese fosse publicada o mais rápido possível, antes mesmo das eleições 2014, pois funcionaria como “uma bíblia para os atores do processo eleitoral, por conta da originalidade do estudo, especialmente na doutrina das nulidades eleitorais e do poder regulamentar da Justiça Eleitoral”, sugestão formalizada pela comissão julgadora.

Informações do site consultor Jurídico