Por Josué Cândido da Silva
Recentemente a Secretaria de Educação da Bahia lançou a consulta pública sobre a reestruturação do Ensino Médio. Basicamente, a proposta consiste na redução da carga horária da Formação Geral Básica de 3.000 para 2.400 horas, o que leva necessariamente à redução das aulas das disciplinas que compõem a formação geral, na maioria dos casos, pela metade. Disciplinas como Inglês, Arte, Filosofia e Sociologia ficam com apenas uma aula por semana, Matemática e Português, duas. Tal redução é justificada com o acréscimo dos chamados “itinerários transdisciplinares”, uma série de disciplinas aleatórias como “educação digital” ou “etnomatemática” entre outras.
Tal reformulação, não deixa claro como poderá melhorar a qualidade do Ensino Médio da Bahia, que ocupa as últimas posições nas avalições nacionais, mas é certo que ela aumentará o fosso entre o ensino privado e público no Estado. Os alunos das escolas públicas com menos aulas estarão em piores condições para disputar uma vaga na universidade com os alunos da rede privada que têm, no mínimo, o dobro das aulas de Matemática, Português, Inglês, Arte, Filosofia e Sociologia, por exemplo. Dessa forma, o Governo do Estado da Bahia deixa claro que as Universidades Públicas, pagas com o dinheiro do contribuinte baiano, não estão abertas aos jovens das classes populares.
Outro agravante é que com a redução da oferta de aulas, os professores terão que completar sua carga horária em várias escolas, tornando suas condições de trabalho ainda piores. Ou terão que completar a carga horária, ministrando disciplinas nos tais “itinerários transdisciplinares” para os quais não foram formados e nem preparados pela Secretaria Estadual de Educação. Ou seja, serão forçados a ensinar o que não sabem e “se virar” para criarem conteúdos de disciplinas que não têm nem ementa, nem programa. Além disso, há um claro desestímulo a que os jovens desejem se tornar professores. Afinal, quem vai querer se formar em um mercado profissional que, ao invés de estar em expansão, está sendo reduzido pela metade? Quem vai querer se formar quando não há perspectiva de que terá emprego no futuro se nem os professores que estão hoje trabalhando na rede pública têm essa garantia?
Essa proposta do Governo do Estado da Bahia apresenta ainda outra questão intrigante: com a maioria das escolas do Ensino Médio se tornando escolas de tempo integral, ao mesmo tempo em que se reduz da carga horária da Formação Geral Básica, o que os jovens vão fazer na escola o dia inteiro? É o que, creio eu, muitos pais devem estar se perguntando agora. Com os baixos índices em educação, era de se imaginar que as escolas públicas de tempo integral se equiparassem à carga horária da Formação Geral Básica das escolas particulares, no mínimo. Se já está difícil para os professores darem conta do currículo do Ensino Médio como está hoje, imagine com a metade do tempo?
Se existe algo de positivo nessa reestruturação do Ensino Médio, é que ela ainda não foi implantada e ainda podemos lutar para impedi-la. Pais, alunos e professores precisam se mobilizar e discutir nas escolas qual a educação que queremos.
Uma educação de qualidade se faz com a valorização dos profissionais da educação; com formação permanente dos professores em parceria com as universidades federais e estaduais e com uma carga horária de Formação Geral Básica de no mínimo 2.800 horas, que permita aos professores desenvolverem seus conteúdos. Todos os chamados “itinerários transdisciplinares” podem ser trabalhados tranquilamente como projetos nas escolas, sem que seja preciso criar novas disciplinas para isso. Aliás, é assim que ocorre nas escolas que são referência em ensino tanto no Brasil como no exterior.
Está na hora da Secretaria da Educação do Governo da Bahia convidar a sociedade para conversar, principalmente aqueles que mais entendem de educação: os/as professores/as. Muitas vezes, as melhorias surgem de medidas simples. Querer encontrar soluções mirabolantes pode nos levar a uma mudança para pior.
Josué Cândido da Silva é doutor em Filosofia pela PUC-SP e professor pleno da UESC.
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