Os bastidores da eleição proporcional em Ilhéus: o que ainda está em jogo


Por Jamesson Araújo

A eleição proporcional em Ilhéus, que elegeu os 21 vereadores no dia 6 de outubro, está longe de chegar ao fim. De acordo com informações do Blog Agravo, o Partido da Mulher Brasileira enfrentou problemas durante a eleição, com uma candidata desistindo e outra tendo a candidatura indeferida pelo TRE/BA por falta de filiação partidária, o que impossibilitou o cumprimento da cota de 30% de mulheres.

O PMB obteve 5.006 votos e elegeu um vereador, Neto da Saúde, que obteve 681 votos. No entanto, no último sábado, o TRE/BA negou o provimento da candidatura de Mariângela Conceição Santos, conhecida como Mary, do PMB. Se ela recorrer ao TSE e perder, o vereador eleito Neto da Saúde poderá perder sua vaga, resultando em um novo cálculo do coeficiente eleitoral, que impactaria com a saída do vereador reeleito Nerival (PSD) da lista de eleitos e possibilitaria a entrada de Cláudio Magalhães (PC do B) e Fabrício Nascimento (Avante).

Com a decisão judicial do TRE, os partidos devem requerer à justiça eleitoral a aplicação imediata da súmula sobre fraude à cota de gênero (Súmula 73). Além disso, há investigações em andamento que podem afetar cinco partidos que tiveram candidatas com votações extremamente baixas, podendo configurar fraude eleitoral de acordo com a Súmula 73 do TSE.

Segundo informações colhidas por investigações feitas por agentes partidários, uma candidata a vereadora, de um partido que não alcançou o coeficiente, fez campanha para outro candidato, além de ter na mesma legenda o namorado como candidato. Esse caso também se enquadra na súmula 73!

Um caso emblemático é o do Partido Progressista, onde o candidato Ratinho Menezes foi registrado como mulher, induzindo inclusive o Ministério Público Eleitoral a parecer favoravelmente. Após a correção para gênero masculino, o partido não conseguiu atingir a cota de 30% de gênero.

Com a possível revisão de todos os casos, estima-se que até cinco cadeiras do legislativo ilheense para 2025 possam ser modificadas com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário.

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Súmula 73

A Súmula 73 do Tribunal apresenta o seguinte enunciado:

A fraude à cota de gênero, consistente no que diz respeito ao percentual mínimo de 30% de candidaturas femininas, nos termos do art. 10, § 3º, da Lei 9.504/1997, configura-se com a presença de um ou alguns dos seguintes elementos, quando os fatos e as circunstâncias do caso concreto assim permitirem concluir:

  • votação zerada ou inexpressiva;
  • prestação de contas zerada, padronizada ou ausência de movimentação financeira relevante;
  • ausência de atos efetivos de campanha, divulgação ou promoção da candidatura de terceiros.

O reconhecimento do ilícito acarretará as seguintes consequências:

  • cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) da legenda e dos diplomas dos candidatos a ele vinculados, independentemente de prova de participação, ciência ou anuência deles;
  • inelegibilidade daqueles que praticaram ou anuíram com a conduta, nas hipóteses de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE);
  • nulidade dos votos obtidos pelo partido, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário (artigo 222 do Código Eleitoral), inclusive para fins de aplicação do artigo 224 do Código Eleitoral, se for o caso.

Jurisprudência do TSE

Somente em 2023, o Plenário do TSE confirmou, nas sessões ordinárias presenciais, 61 práticas de fraude à cota de gênero. Em 2024, esse número já passou dos 20. O crime também foi reconhecido em julgamentos realizados no Plenário Virtual, tendo sido condenados, em apenas uma sessão – realizada de 23 a 29 de fevereiro –, candidatos e partidos políticos em 14 municípios de seis estados do país.

Em quase todos os casos, são utilizadas candidaturas femininas fictícias para concorrer ao cargo de vereador. Como o partido não consegue atingir o mínimo exigido por lei para ser ocupado por candidaturas de cada gênero, comete a fraude para ter o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários deferido e, assim, poder concorrer nas eleições.

Ao julgar casos de comprovada fraude à cota de gênero, as decisões do Tribunal seguem um padrão. Após o julgamento e a confirmação do crime, as legendas são punidas com a anulação dos votos recebidos para o cargo naquele pleito. Também é determinada a cassação do DRAP e dos diplomas das candidaturas a ele vinculados.

Como consequência, é necessário o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário (por se tratar de eleição pelo sistema proporcional). Além disso, em alguns casos, é declarada a inelegibilidade das pessoas envolvidas na fraude.

O que é uma súmula?

Um conjunto de decisões da Corte que seguem uma mesma linha de entendimento sobre determinada questão jurídica pode resultar na criação de uma súmula, que tem como objetivo uniformizar, em um enunciado, uma jurisprudência já consolidada no Tribunal. A súmula pode, a partir daí, ser aplicada em julgamentos semelhantes.