Cabana de Praia e terreno de Marinha


Por Gustavo Kruschewsky

gustavoDe pórtico vale dizer que notícias de bocas pequenas chegaram ao conhecimento da população Ilheense que as Cabanas de praias de Ilhéus terão que ser demolidas por ordem da UNIÃO.  Por essa razão e a pedido de amigos e amigas, e pela manchete que li no Blog Agravo intitulada: “Novo governo de Ilhéus quer solução para cabanas de praia”, resolvi fazer este sucinto comentário fundamentado em base jurídica com o intuito de esclarecer aspectos ao leitor que considero importante.

É preciso conceituar o que seja terreno de Marinha: Terreno de marinha é compreendido numa área de 33 – trinta e três – metros, iniciando-se da linha da preamar-média do ano de 1831 para dentro da terra, nas áreas banhadas por água sujeitas à maré, consoante o artigo 2º do Decreto-Lei nº 9.760, de 05 de setembro de 1946. Portanto, observe-se a dificuldade que se tem para  aferir qualquer área que se diz “Terreno de Marinha” na atualidade. “A linha da preamar média significa a média da maré alta apurada no ano de 1831 (mil oitocentos e trinta e um), lá se vão aproximadamente 185 anos. Aí começa a confusão, porque não é a linha da preamar-média atual, do próximo ano ou de qualquer outro período. É efetivamente a linha da preamar média que foi apurada 185 (cento e oitenta e cinco) anos atrás. Estudiosos neste assunto têm se posicionado que vários órgãos inclusive  da União a exemplo do SPU – Serviço de Patrimônio da União – têm se mostrado com dificuldades  em realizar tal façanha. Essa questão é efetivamente complexa.

Acresce que o Terreno de Marinha não deve ser considerado como área de praia. Há diferença entre  praia e  terreno de marinha. Senão vejamos:  Quem define essa questão é o § 3º do artigo 10 da Lei nº 7.661, de 16 de maio de 1988, o qual criou o Plano Nacional de Gerenciamento das Costas Brasileiras, ao prevê o que adiante se segue: “Entende-se por praia a área coberta e descoberta periodicamente pelas águas, acrescida da faixa subsequente de material detrítico, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou, em sua ausência, onde comece um outro ecossistema”. A praia é um bem público, mas não é elencada legalmente como bem dominical ou dominial como acontece com o terreno denominado de marinha.

Logo, a praia é um bem de toda gente que pode ter acesso temporariamente, ou seja tomar sol, banhar-se nas marés e caminhar, praticar esportes de forma disciplinada à vontade, dentro das regras do bom costume e respeitando as normas jurídicas do bem viver que devem ser seguidas por todos e lembrando-se que veículo auto motor não é permitido o seu trânsito. Apenas o uso da bicicleta ou similar que é denominada de veículo de propulsão humana, é permitido. As pessoas podem e devem frequentar a praia, sobretudo para o exercício do lazer. O terreno de marinha, na vastidão que se confunde com a praia, pode e é naturalmente visitado por todos. Mas, não se deve tomar posse – nem fazer edificação definitiva – sem autorização formal da União. O terreno de marinha é um bem público dominical suscetível a determinadas regras públicas estabelecidas para a sua ocupação com fim de realizar alguma tarefa rendosa fixa por tempo determinado, ou então se ter o domínio, podendo ser alienada pela União por força de Lei.  Já pensaram – parece até hilário – demarcar, separando  os terrenos de Marinha dos terrenos de praia para as pessoas terem acesso? Impossível.

Importante que os interessados (cabaneiros) observem o artigo 9º do Decreto-Lei nº 9.760/46 o qual prevê que é de competência da SPU – Secretaria do Patrimônio da União – posicionar as linhas da preamar-média do ano de 1831, como também tomarem outras providências previstas no parágrafo 11 do referido instituto que estabelece todo o procedimento administrativo. Tudo isso para saber se as barracas notificadas estão em terrenos de marinha ou não, considerando que com o tempo (cento e oitenta e cinco anos), conforme as vicissitudes dos acontecimentos terrestres e marítimos, a União já pode ter perdido muitas áreas de “terreno de marinha”.

Mas, se ficar “provado” que as ditas Cabanas estão em terreno de marinha – e não estão em terreno de praia ou acrescido de marinha ou em terreno alodial que são terrenos vizinhos ao Terreno de Marinha e considerando que  o TERRENO  DE MARINHA  é um bem público dominical ou dominial, como já cediço,  podendo ser usado para a obtenção de renda, ou seja, que pode até ser alienado pela UNIÃO, transferido para o domínio de outrem, sugere-se que haja efetivamente entendimento entre representantes da União, representantes do município de Ilhéus e interessados da Associação dos cabaneiros para que os terrenos já edificados com Cabana, já em funcionamento,  sejam transferidos o domínio pela UNIÃO ao interessado, reafirmando-se que o terreno de marinha é um bem público dominical ou dominial, podendo ser, pela União alienado, ou seja transferido o domínio em caráter oneroso para o adquirente, gerando fundos para a UNIÃO e que essas Cabanas se tornem compatíveis com o Projeto ORLA que está no papel – salvo melhor juízo – desde 2006.

Vale dizer que as Cabanas de praias disciplinadas pelo contrato de cessão de uso onerosa, desaconselha-se, devendo ser na atualidade evitada pelo fato da União, querendo, retomar o bem público dominical a qualquer tempo e que o Cabaneiro que ali se instalou depois do ano de 1977 não ter por lei direito a indenização. Efetivamente que não se inviabiliza que esse bem público dominical caso  transferido para o domínio privado – alienado pela União – mesmo que haja uma desapropriação futura para fins sociais, não retira o direito do possuidor e proprietário de receber a devida indenização por parte da União. Essa é a garantia.

Não se pode, na verdade, é olvidar, cair no esquecimento, de que esse conjunto de barracas nas praias de Ilhéus, os seus serviços, nesses longos anos, terem sido muito importante para atender às necessidades de consumo e conforto para a população autóctone e para os visitantes e também oferecer trabalho e renda pra muita gente da sociedade. Mas, vale ainda considerar que a administração pública municipal e outros órgãos, a exemplo do PROCON, devem fiscalizar a questão dos preços oferecidos pelas referidas barracas. Apenas como exemplos, não é mais possível se cobrar nas barracas de praias,  numa garrafa de 500 ml de água, o preço de 3,50 ou 4,00, e os vendedores ambulantes cobrarem um coco por 4,00 ou 5,00 reais, tendo-se um ganho real de lucro de mais de 300%. Além de outras iguarias de preços exorbitantes. Tudo isso é inadmissível nos dias de hoje. A politicagem de se fazer vista grossa em termos de “fiscalização” não é mais cabível nos tempos da LAVA A JATO.

Finalmente, é bom lembrar que os interessados devem compulsar a Lei LEI Nº 13.240, DE 30 DE DEZEMBRO DE 2015 a qual  “Dispõe sobre a administração, a alienação, a transferência de gestão de imóveis da União e seu uso para a constituição de fundos; altera a Lei no 9.636, de 15 de maio de 1998, e os Decretos-Lei nos 3.438, de 17 de julho de 1941, 9.760, de 5 de setembro de 1946, 271, de 28 de fevereiro de 1967, e 2.398, de 21 de dezembro de 1987; e revoga dispositivo da Lei no 13.139, de 26 de junho de 2015”. Além do Decreto 9.760/46;”. Ainda compulsarem  o § 2º do artigo 49 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, os arts. 98/99/100/101/102 e 103 do Código Civil que está a viger, e outros institutos pertinentes à matéria ora em comento.

*Gustavo Cezar do Amaral Kruschewsky é Professor e Advogado.