Por Joaquim Falcão, professor da FGV Direito Rio.
Na democracia não deve existir poder sem controle. Controlar antes, durante e depois. Tenha o poder sido exercido ontem ou hoje.
Jacques Chirac e Nicolas Sarkozy responderam a processos na França depois de saírem do poder. Berlusconi, na Itália. Helmut Kohl, na Alemanha. Israel Ehud Olmert, ex-primeiro ministro de Israel, foi preso ano passado. José Sócrates, de Portugal, estava detido até pouco tempo. Uns são absolvidos, outros condenados.
É atípica situação previsível.
Do ponto de vista legal, porém, não se investiga nem presidentes nem ex-presidentes. Investiga-se o cidadão comum, igual aos outros. A lei por vezes cria proteções especiais como o foro privilegiado quando o cidadão ocupa cargo político importante. Mas aí não se protege a pessoa, mas o cargo. Por quê?
Porque o cargo pertence à República. O cidadão, não. Em princípio, se espera que um Supremo ou um tribunal de Estado seja mais independente e prudente. Trata-se de um colegiado. Muitas cabeças, em vez de uma só.
Recentemente, tivemos o julgamento e condenação do ex-governador de Minas Gerais Eduardo Azeredo. Foi julgado como pessoa comum. Em foro comum. Pela primeira instância. Como manda a lei.
O importante é que a investigação e o processo sejam transparentes, previsíveis, com amplo direito de defesa e imunes aos humores e ideologias de investigadores e juízes.
Sobretudo em momentos de radicalização política. Quando se investiga não apenas um ex-presidente da República, mas, talvez, um futuro candidato à Presidência. Às vezes, politicamente, a investigação apenas já é a pena.
A Operação Zelotes não atinge apenas o ex-presidente. Vai mais longe. É do conhecimento público a pressão e indevida influência que grupos poderosos fazem sobre o Poder Executivo para obter rapidamente um benefício fiscal, ou no caso até perdão de dívidas milionárias. Levar vantagem via MP.
A influência de uma autoridade pública é perigosa. Maior perigo quando envolve assessores, lobbies e grandes corporações.
A curto prazo, investiga-se um ex-presidente. Indícios podem ou não ser confirmados. A médio prazo, se comprovadas as denúncias, estamos diante de algo mais amplo: o desenho democrático de nossas instituições.
Uma medida provisória, em geral, é feita sem transparência, sem votos, vigora logo, beneficia imediatamente e coloca o Congresso no corner.
Se tudo comprovado, seria correta esta deturpação das medidas provisórias? Seria correta esta maneira de se fazer negócios e política no Brasil?
*Artigo de publicado originalmente na Agência O Globo.
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