Por Julio Gomes
Quase todos os anos viajo para Bom Jesus da Lapa, no sertão da Bahia. Como não sou tão católico a ponto de ir à missa todos os dias, nem jovem e rico o suficiente para ficar em festas e bebedeiras todas as noites, prefiro fazer da viagem o melhor da viagem.
Deixe-me explicar melhor: levo de quatro a seis dias para ir de Ilhéus à Lapa. Vou parando, passando pelas cidades, alterando o roteiro entre a borda da Chapada Diamantina e o Sertão, almoçando em numa localidade e dormindo em outra, enfim, fazendo um tour pelo interior da Bahia.
Nessas idas, reparo nas casas, nas roças de palma, no gado, nas pessoas e suas roupas, carros e montarias. Reparo na terra de cor forte do sertão e no cinza da paisagem com vegetação seca. Reparo nas lojas e nas atividades econômicas, nos costumes e nos falares. Deus nos deu olhos para vermos as coisas, e cabeça para pensar.
Na última ida à Lapa fizemos um roteiro no qual, ao invés de seguir por Vitória da Conquista, que é o caminho mais lógico, entramos em Ponto de Astério e seguimos por Iguaí, Nova Canaã, Poções, Bom Jesus da Serra, e daí para o sertão propriamente dito, por Mirante (Você sabe onde fica? Já ouviu falar?), Tanhaçu, Ituaçu, Barra da Estiva, Jussiape, Rio de Contas, Livramento de Nossa Senhora, Paramirim, Tanque Novo, Igaporã, Riacho de Santana e, finalmente, Bom Jesus da Lapa.
Pois é, a Bahia é muito grande, do tamanho da França. E, como está nas Escrituras Sagradas, há muitas moradas na casa de meu Pai.
Muito bem, Em quase todas as cidades e lugarejos onde passei, vi evidentes sinais de progresso, de crescimento econômico, de desenvolvimento mesmo.
Não se vê mais, na beira das estradas, as pobres casas de taipa, agora substituídas por casas bem cuidadas feitas de blocos e cobertas com boas telhas, tendo ao lado a cisterna para armazenar água e, geralmente, um carro ou moto na porta, todas servidas de energia elétrica. Até o gado e os cães não exibem mais aquela magreza esquelética.
As cidades cresceram. Muitas delas estão começando 1 ou 2 km antes, em relação à viagem feita a quatro anos passados. E não é crescimento de favelas, mas de bairros que avançam ao longo da rodovia.
O comércio melhorou, as pousadas e hotéis melhoraram (há vinte anos atrás sequer existiam em muitas cidades), e as cidades do sertão, salvo raras exceções, estão sempre limpas e bem varridas, sem um papel no chão das ruas.
Entretanto, quando retorno a Ilhéus, parece que entrei no túnel do tempo. A Av. Itabuna é a mesma há 25 anos. A única grande modificação foi a construção da rodoviária na entrada de Ilhéus, construída na década de 1990, quando Antonio Olimpio era prefeito, e inaugurada pelo finado ACM.
Na mesma Av. Itabuna a autorizada Chevrolet virou distribuidora de bebidas e hoje é sabe Deus o quê. Mas o prédio é o mesmo. O que era o Rodoviário Ramos virou panificadora e hoje é outra coisa, mas não mudou em quase nada. A entrada do Malhado se encontra cercada das mesmas casas pobres, e até a boa padaria de Roque Morais deixou de existir. Se não fosse o antigo Posto Falcão ter se tornado uma espécie de shopping que oscila no vinga- ou-não-vinga, tudo seria exatamente igual a 30 anos passados.
Bem, surgiu e cresceu o Bairro Teotônio Vilela, hoje com cerca de 30 mil habitantes, mas mal urbanizado e mal cuidado pela administração pública. E entre a Rodoviária e a entrada do Vilela floresce uma paupérrima favela onde outrora havia um belo bambuzal de ambos os lados da estrada.
O terminal Urbano está cada dia está pior, e o centro de Ilhéus também é quase o mesmo. A diferença fica por conta das lojas de departamento (Casas Bahia, Lojas Americanas, etc.) que vieram para cá, mas a arquitetura, o trânsito e até os vendedores ambulantes nas calçadas são basicamente os mesmos, como se o tempo não houvesse passado.
Mas o tempo passou. Nós é que perdemos a oportunidade de crescer, de nos desenvolvermos, de irmos em direção ao futuro. Com péssimos prefeitos e com uma população que, na média geral, parece cada vez mais distante dos valores do estudo e do trabalho, patinamos perdendo tempo, dinheiro e desperdiçando o melhor de nossas vidas numa espécie de limbo ou purgatório econômico, com trágicas consequências sociais.
Levanta-te Ilhéus, enquanto é tempo. O mundo progride. Acompanhemos as boas coisas trazidas pelo progresso e pela modernidade, e não só os maus exemplos. Temos que crescer, em todos os sentidos, pois esta é a finalidade da vida.
Acorda Ilhéus!
Julio Cezar de Oliveira Gomes
Professor, graduado em História; e Advogado, graduado em Direito, ambos pela UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz.
Deixe seu comentário